Prezados confrades (confrades e confreiras)
Tivemos ontem, 08 de junho de 2020, uma reunião sui generis na nossa Academia de Medicina da Bahia.
Foi uma reunião exclusiva dos acadêmicos, sem diapositivos, e baseada na opinião expressa oralmente dos confrades em torno do tema dominante do momento, a COVID-19.
A Academia de Medicina da Bahia já havia feito sessões expositivas sobre o tema: em 13 de abril tivemos uma extensa, detalhada e profunda apresentação do confrade Roberto Badaró.
Em seguida tivemos 3 sessões interdisciplinares expositivas com participação de confrades como Jorge Pereira, Cesar Araújo Neto, Luiz Freitas e eu mesmo.
Ontem tivemos uma reunião diferente dessas. Tivemos a oportunidade de ouvir a opinião, que como se antecipava, altamente qualificada, em torno de temas específicos que se identificam nessa Pandemia.
Assim após brevíssima introdução que fizemos sobre o tema tivemos a oportunidade de ouvir e nos apropriar de informações sólidas que se iniciaram por uma detalhada demonstração da capacitação consistente de diversas formas de vacina contra o SARS-CoV2 resultando em centenas de projetos já em curso para a sua obtenção , pelo confrade Mitermayer Reis, ao que se seguiram considerações do confrade Bernardo Galvão sobre as razões porque nem todas as infecções virais importantes conseguiram sua vacina. O confrade Jorge Pereira ressaltou o reconhecimento cada vez maior das alterações trombóticas pulmonares de grandes e pequenos vasos na essência da determinação da pneumonia da COVID19. Fato esse corroborado pelo confrade Luiz Freitas.
O confrade André Almeida enfatizou o papel do POCUS na caracterização do envolvimento cardíaco além da medida de marcadores de necrose miocárdica como a troponina e ,uma vez mais, sob o ponto anatomopatológico , o confrade Luiz Freitas ressaltou o entendimento de que o envolvimento cardíaco é mais fruto do processo inflamatório sistêmico e hipóxico, do que aparentemente da invasão pelo vírus.
A confreira Reine Chaves destacou no conhecido risco oferecido pela obesidade e pelo DM 2 os seguintes conceitos: primeiro, o diabético sob controle tem risco bem menor e segundo, interessa muito para melhorar a evolução do paciente a determinação da glicemia na chegada e o seu rigoroso controle subsequente. A confreira Leila Araújo relata caso de tireoidite em meio a COVID-19 porem crê que sejam necessárias mais evidencias para que se estabeleça uma relação causal. O confrade Reynaldo Martinelli traz vários aspectos da agressão renal aguda frequentemente vista na COVID-19 do paciente mais grave, não raramente com suporte dialítico, geralmente decorrente das graves alterações hemodinâmicas em curso, porem também das alterações inflamatórias sistêmicas registradas, mas também chamou a atenção para recente publicação americana em que por microscopia eletrônica em 3 casos, verificou-se presença direta do vírus.
O confrade Jecé Brandão menciona o reconhecimento progressivo do envolvimento do tubo digestivo e o confrade Raymundo Paraná detalha tal envolvimento destacando que achados hepáticos parecem ser mais consequência do achado toxico geral do que por infecção direta viral, talvez pela pouca expressão da ECA-2 no fígado.
O confrade Vieira Lopes nos faz um detalhado relato da experiência local de gestações e COVID-19 mostrando que não tem sido muito frequente porem num cenário mundial tem sido reconhecido e as vezes com necessidade de apressar o parto. A confreira Lícia Moreira crê como p[provável a transmissão vertical do vírus porem chama a atenção para a contaminação pós-parto do recém-nascido pela mãe portadora e pessoal de saúde.
O confrade Antônio Alberto Lopes tece considerações bem fundamentadas sobre características diagnósticas de um teste e chama a atenção para que se atente para o cálculo de likelyhood ratio para que este seja melhor utilizado. O confrade Roberto Badaró tece críticas severas sobre a aplicação inadequada dos testes vigentes para COVID-19 quanto a sua temporalidade ou mesmo a qualidade dos métodos disponíveis.
O confrade Jadelson Andrade nos mostra a linha de cuidados para pacientes COVID-19 e não COVID, num momento em que um comitê de crise deves ser constituído em cada Instituição de modo a prover EPIs adequados e fluxos de condutas atentas e que são modificadas e adaptadas às necessidades do dia a dia.
O confrade Luis Cláudio Lemos tece considerações bem refletidas sobre a admissão de certas condutas imprescindíveis não necessariamente testadas sob a forma de ensaios comparativos e que devem ser poucas e fundamentais, porem chama a atenção de que a simples adoção de medidas menos plausíveis sem testes adequados podem se associar a eventuais riscos imprevistos e portanto estas deveriam ser convenientemente testadas antes de sua normatização.
O confrade Roberto Badaró tece comentários sobre estratégias de tratamento e demonstra que há ampla variação de condutas no mundo e o esforço é crescente para a construção de indicações mais uniformes que não estão ainda assentadas.
O confrade Jorge Pereira considera a possibilidade de sequelas pulmonares após a recuperação e eu trouxe informações sobre estudo com ressonância cardíaca feito na China cerca de 40 dias após o início da doença, já fora do hospital, mostrando que cerca de 40% destes casos mostram evidências ainda de edemas e fibrose miocárdica e dilatação de ventrículo direito. Assim possivelmente haverá um contingente de pacientes afetados pela COVID-19 que merecerá acompanhamento cuidadoso após a alta hospitalar.
O encerramento da plataforma de streaming interrompeu a possibilidade de dois outros temas que teríamos igualmente solicitado a dois confrades presentes à reunião, o confrade Irismar Reis e a confreira Eliane Azevedo que seriam perguntados então sobre repercussões possíveis da síndrome da angustia pós-traumática e reflexões espirituais trazidas pela Pandemia.
Tudo isso transcorreu sob o atento olhar dos confrades Agnaldo David de Souza, Alex Guedes, Antônio Andrade , Antônio Natalino, Cesar de Araújo, Edval Fahel, Eliane Azevedo, Helma Cotrim. Irismar Reis, Jorge Bastos, José Valber Menezes e Nubia Mendonça.
Creio que foi memorável momento da Academia onde ficou bem claramente evidenciada a enorme importância de cada um dos seus componentes.
Houve problemas com a transmissão que não chegaram a empanar a reunião.
“Tudo vale a pena quando a alma não é pequena.”
Texto de autoria do Presidente do Comitê Científico, Dr. Gilson Feitosa; e do Presidente da Academia de Medicina da Bahia, Dr. Antônio Carlos Vieira Lopes.