Excelentíssimo Dep. Adolfo Menezes, Presidente da Assembleia Legislativa, Senhores Componentes da Mesa (Otto Alencar, Francisco Neto , Jorge Solla, Delvone Almeida, Victoria Paraná, Guilherme Marback, Ana Paula Boente Elias, Alberico Mascarenhas, Rafael Vita).
Agradecimento ao deputado Jean Fabricio pela indicação do meu nome para a comenda mais importante desta casa.
Estou aqui representando “tantas pessoas” que lutam por um sistema de saúde equânime e por uma formação médica de excelência, focada nas necessidades do sistema de saúde, não importa se público ou privado, pois o sistema de saúde no Brasil é ÚNICO.
Quem sou eu?
Eu me chamo Raymundo Paraná Ferreira Filho. Sou filho de Raymundo Paraná Ferreira, advogado renomado, 101 anos, católico praticante, soteropolitano, de família classe média baixa de Salvador. Um advogado dos mais conceituados nos anos 1980 e 1990 e no início deste século. Escalou a pirâmide social com mérito e honestidade, rumo a uma condição econômica confortável que pôde dar aos seus filhos a melhor educação disponível. Ensinou aos filhos a humildade e a preocupação com o próximo. Sempre pontuou as suas origens, inclusive a ajuda que recebia das irmãs para estudar.
Alice Paraná, minha mãe, soteropolitana, abdicou da sua graduação superior para cuidar dos filhos, mas jamais abdicou dos seus estudos. Dona de uma ótima oratória, sobretudo no quesito religiões, onde nos apresentou as bases do Espiritismo Kardecista, como também sempre nos incentivou à tolerância religiosa e a compreender tudo de bom que havia em todas as religiões. A primeira vez que eu me interessei pela leitura acerca das religiões de matriz africana foi por orientação da minha mãe. Nesta mistura familiar temos sobrenome e sangue de povos originários, mesclado ao negro e europeu. Eis a Bahia representada aqui pela família PARANÁ.
Meus irmãos Antônio Humberto, Engenheiro, Maria Alice, Advogada e Empresária, e André, Administrador e Empresário, compõem a minha mestiça (com orgulho) família de origem, sempre muito unida. Temos ainda muitos irmãos agregados, trazidos para o campo magnético da família Paraná para receber cuidado, carinho e educação. Aqui temos nesta mesa um irmão agregado, Paulo Miguez, reitor da UFBA.
Na minha família nuclear, sou casado com Marla Cruz, Médica e Empresária, há 29 anos. Tenho 4 filhos, Gabriela, Danilo, Vitória e Cecília, Vicky, biomédica e aluna de mestrado da Fiocruz, representa toda a família Paraná, que muito me orgulha. Recebemos há 2 anos um presente que me fez conhecer uma nova face de amor: o nosso neto Valentim.
Do meu pai, herdei a responsabilidade com o próximo, a sensibilidade pelas causas sociais, o desabafo através da escrita e a ética a todo o custo.
Da minha mãe, herdei a vontade de estudar, a tolerância religiosa, e a necessidade de me posicionar na oratória.
Da minha mulher, tive sempre um porto seguro e uma voz que me traz à realidade diante da minha tendência voante.
Qual a minha religião?
Todas!
Desde que acolham qualquer cidadão, independentemente das suas orientações de gênero, de sexualidade e de escolhas políticas (desde que as suas escolhas sejam também tolerantes à escolha alheia);
Desde que não preguem ódio, guerras, armas;
Desde que não apoiem Teocracias;
Desde que não julguem, mas obedeçam aos julgamentos dos poderes competentes democraticamente instituídos;
Desde que tolerem a religião do próximo;
Desde que não queiram transportar as suas crenças e dogmas do seu ambiente familiar e religioso para políticas públicas de saúde.
Entendi desde cedo que o cristianismo não tem dogmas. É uma escolha de vida, uma filosofia. De tão tolerante e de tão revolucionário que é, precisaram criar as religiões para contêlo.
Como me formei?
Fui aluno do Colégio Marista, onde tive uma sólida formação humanística e social. Lá, fiz os meus primeiros e longevos amigos, aqui representados pelo Guilherme Marback, meu compadre. À minha família de origem e ao Marista, devo esta imensa preocupação com a justiça social, e devo também uma sólida formação baseada em princípios.
Adentrei na Faculdade de Medicina da UFBA em 1977. Esta foi a 1ª instituição de ensino superior no Brasil. Foi lá que:
1. graduamos a 1ª mulher médica do Brasil;
2. A 1ª médica negra do Brasil;
3. A 1ª professora negra do Brasil;
4. E hoje temos um Diretor negro da nossa faculdade depois de 2 séculos;
5. Foi lá onde nasceu a escola tropicalista de Pirajá da Silva;
6. Juliano Moreira, negro, neto de escravos, poliglota, revolucionou o tratamento das doenças mentais no Brasil;
7. Martagão Gesteira, que levou a pediatria Hospitalar para todo o Brasil a convite de Getúlio Vargas;
8. Clementino Fraga, que consolidou o ensino da Clínica Médica na UFRJ.
A Faculdade de medicina da UFBA formou muitos outros esculápios que espalharam a boa medicina pelo Brasil.
Um curso repleto de excelentes Professores, dos quais citarei alguns em nome de todos: Eliane Azevedo, que não pôde estar aqui nesta Mesa por questões médicas, Gilberto Rebouças, Helito Bittencourt, Hélio Santos, Luiz Lyra, Heonir Rocha, Carlos Marcílio, Zilton Andrade, Adilson Sampaio, Achiléa Bittencout, Armênio Guimarães, João Souza Filho, Fernando Didier, Fernando Kleber, Rodolfo Teixeira, Antônio Carlos Vieira Lopes, Zezito Magalhães, Nelson Barros, Almério Machado, Peçanha Martins, Thomaz Cruz e tantos outros que marcaram a minha vida e que me ensinaram a sempre ter um eixo de raciocínio clínico e nunca abandonar um paciente.
Foi através deles que aprendi que Medicina se faz com Humanismo e raciocínio clínico. Que o exame laboratorial ou de imagem é sempre complementar ao eixo do Raciocínio e baseado na anamnese e exame físico. Não deixe de tocar no seu paciente!
Que a base da boa medicina necessita boa relação médico/paciente, construída numa consulta com tempo suficiente.
Que um médico trata paciente, não trata exames.
Que médico que solicita muito exame esconde deficiência técnica (atualmente posso dizer que moral também), pois quem não sabe o que procura valoriza mal o que encontra.
Foi ao longo do meu curso médico que pude entender o absurdo hiato social que condena o nosso país ao subdesenvolvimento.
Este país teve ciclos de crescimento econômico, mas nunca se desenvolveu devido a sua Vultosa dívida social que persiste em eterna inadimplência.
Na época, de acadêmico de medicina, ainda no passado e nada saudoso regime militar, o apartheid social deste país era pior.
Na área da saúde, atendíamos o paciente com um cartão de identificação de “indigente”, isso porque ele não fazia parte dos 25% dos brasileiros que tinham seguridade social (carteira assinada), portanto, eles dependiam da caridade, e não do Estado para a provisão de saúde.
As nossas Enfermarias eram repletas de doenças que, felizmente, vemos com muito menos frequência atualmente.
As desnutrições Kwashiorkor e Marasmo, as verminoses graves, doenças de Chagas e esquistossomose, o tétano, a catapora, o sarampo grave, difteria e a poliomielite (paralisia infantil). Felizmente, o estudante de medicina atual já não vê este cenário tenebroso, pois já nasceu num país democrático que foi capaz de gerar o SUS com o mais vitorioso programa de vacinação que o mundo já conheceu. No Brasil do SUS, vacinamos sincronicamente o vulnerável povo ribeirinho da Amazônia e o poderoso povo da Faria Lima. Melhoramos também em saneamento básico e suprimento de água.Considero que quem prega contra as vacinas comete crime contra a humanidade.Antes do SUS, esforçávamos para diagnosticar pacientes, mas não tínhamos como tratá-los, porque não havia programa de assistência farmacêutica.
O meu curso médico me permitiu ser aprovado na Residência em São Paulo. Residência de Clínica Médica e, em seguida, Residência de Gastroenterologia, no Hospital das Clínicas daUSP.
Eu queria mais. Queria ser um Hepatologista de fato, contudo, no Brasil não havia uma Residência Médica estruturada em Hepatologia. Os Gastroenterologistas abraçavam a Hepatologia como um apêndice, mas, àquela altura, já com novas ferramentas diagnósticas e terapêuticas, a Hepatologia se expandia muito rapidamente além da fronteira da Gastroenterologia. Era preciso ir adiante.
Já aprovado no FMGEMS, prova de suficiência para médicos que queriam atuar nos Estados Unidos, meu destino seria lá, mas me encantei com a palestra do Professor Christian Trépo no Congresso Brasileiro de Hepatologia em 1986. Empolgado com a palestra sobre Hepatites Virais, meu tema favorito, busquei conversar com o Professor Christian Trépo imediatamente após a sua palestra; tivemos forte empatia e daí surgiu a oportunidade de ir para a França. Contei com a ajuda dos saudosos Professores Roberto Santos e Carlos Marcilio no CNPq. Em Lyon, pude contar com o Professor Christian Trépo e sua esposa Ucraniana (Luda), que nitidamente me acolheram e me introduziram no seleto grupo da Hepatologia mundial.
A MINHA VIDA ACADÊMICA
No meu retorno, já existia o SUS em formação. Ainda embrionário, já mostrava vida. Já aprovado no último concurso DASP, em São Paulo, desde 1984, vim para o Hospital Ana Neri e, posteriormente, para o Hospital das Clínicas, com a ajuda do então Secretário de Saúde, agora Senador, Otto Alencar. Eu não o conhecia pessoalmente, mas contei com a sua sensibilidade, o que me permitiu a minha atuação na Universidade Federal da Bahia. Em seguida, fiz o concurso para Professor e tive a felicidade de ser aprovado na primeira chamada. Assumi, então, as minhas atividades na disciplina de Clínica Médica, Gastroenterologia e Hepatologia, mas tinha o objetivo de lutar pela Hepatologia como uma Especialidade independente e que desse acesso a todo brasileiro a um Profissional realmente formado em doenças do fígado.
Pude ajudar na formação de diversos profissionais. Eu vou citar alguns deles, e saudá-los em nome de todos os demais.
A Delvone, que está aqui na Mesa, representando a todos: o meu ex-residente, fiel Colega e amigo, Marcelo Portugal, Antônio Ricardo Andrade, Vinícius Nunes, Luís Jesuíno, Karla Melo, Genário Santos, Maria Isabel Schinoni, Viviane Melo, Simone Cunha, Rafael Pinto, Daniel Cavalcante, Marcony Andrade, Leonardo Cañedo, Monica Viana, Flavio Feitosa e muitos, muitos mais. Em adição, foram 15 bolsas para formação complementar na França e em Portugal, beneficiando esses Colegas. Coordenei o Projeto de Cooperação CNPq/Inserm, o CAPES/Cofecub, com formação de pessoal, e da Agência Nacional de Pesquisa em Hepatites Virais da França. Estas atividades me renderam mais de 200 publicações, quase todas em Revistas Internacionais, o que me gerou um índice de citação bem elevado para os padrões do nosso país.
Tudo isso com a ajuda da nossa grande equipe e a consolidação das nossas linhas de pesquisa. Formamos grupos consolidados de pesquisa em carcinoma hepatocelular, hepatites virais e doenças relacionadas, hepatotoxicidade por ervas e drogas e, mais recentemente, doença hepática gordurosa não-alcoólica.
Criamos o 1º ambulatório multidisciplinar no Brasil para atender vítimas das Fake News da internet e redes sociais por toxicidade por ervas e hormônios.
Entre 1999 e 2003 coordenei o Programa de Pós-graduação em Medicina e Saúde da UFBA, onde tive também a oportunidade de convivência com excelentes colegas do Colegiado, que me permitiram expandir, com a inestimável ajuda do Professor Tavares Neto, as fronteiras do nosso curso para formarmos Mestres no Acre e Doutores em Campina Grande.
Neste período, com Paulo Bittencourt e Jorge Bastos, iniciamos o programa de transplante hepático na Bahia, HUPES/HP, que já beneficiou mais de 600 pacientes transplantado. Nossos resultados emparelham com os melhores centros do país.
Homenageio aqui este grande cirurgião Jorge Bastos.
Neste período, tivemos a inspiração de fundar a ONG “Vontade de Viver”, juntamente com Rômulo, com pacientes portadores de Hepatites Virais que foram tratados e estavam em tratamento. Esta ONG acolheu muitos pacientes.
Com a sensibilidade de Jorge Solla e de José Antonio
Rodrigues, então secretários estadual e municipal de saúde, sob visão republicana, criamos na Bahia o sistema de referência e contrarreferência em Hepatologia do SUS, ligando o HUPES aos centros de saúde da Carlos Gomes e da Liberdade.
Motivo da medalha Thomé de Souza da Câmara Municipal de Salvador.
Este projeto avançou e chegou a uma joia do SUS na Bahia que se chama CEDAP Fígado. Devo agradecer ao Secretário FabioVillas Boas, pela sensibilidade de prover este equipamento especializado, repleto de humanismo e respeito ao paciente.
Junto com Mittermayer Reis, fomos ao Ministério da Saúde, em 1999, reivindicar ao Ministro Serra os olhares do Ministério da Saúde para a causa das Hepatites Virais. Naquela época, o Brasil recebia prêmio da OMS pelo excelente Programa HIV, contudo, já se morria muito mais gente por Hepatites Virais do que pelo HIV e nada se falava sobre isso. Lá conhecemos o Jarbas Barbosa (atual diretor da OPAS), então diretor do Centro Nacional de Epidemiologia, juntamente com Eduardo Hage. Começamos o embrião do que seria o Programa Nacional de Hepatites Virais, consolidado em 2003, se tornando um dos mais importantes Projetos de enfrentamento de Hepatites Virais no mundo.
Também no início dos anos 2000 até 2017, convidado pelo então Senador e posteriormente Governador Tião Viana, juntamente com o Professor Tavares Neto, desenvolvemos um excelente Projeto no Estado do Acre. Esse Projeto já havia sido iniciado pelo Professor Tavares Neto e culminou com a Primeira Escola Médica da Universidade Federal do Acre. Em seguida, formamos 25 Mestres para serem Professores dessa Escola e daí em diante eu pude ajudar na organização de Programas de Saúde no Estado do Acre. Na Amazônia Brasileira, as Hepatites Virais são um desastre, mas este desastre atinge populações ribeirinhas, povos originários, que habitualmente não têm voz nem escuta no eixo do poder. Lá, apesar da abundância de pacientes jovens com cirrose hepática e câncer de fígado, não havia sequer um Hepatologista ou Médico formado em Hepatologia. Hoje, a realidade é bem diferente. Conseguimos recursos do Fundo Nacional de Saúde, para a formação de Médicos Amazônicos e de Médicos do Interior da Bahia no nosso serviço do HUPES. Esta é a verdadeira função multiplicadora de uma Universidade. Com isso, formamos 25 Colegas que voltaram às suas cidades para implantar Ambulatórios de Hepatologia e, assim, monitoramos essa atividade por longo período. Motivo da comenda da ordem do Cruzeiro do Sul do estado do Acre. Paralelamente e sempre com o apoio de Jorge Solla, fizemos o serviço de hepatologia do HUPES com a enfermaria 4B, nomeada Gilberto Rebouças. Enfermaria clínico-cirúrgica em parceria com o grande cirurgião Jorge Bastos. Em seguida, as obras do Núcleo de ensaio clínico do HUPES, o centro de infusão de imunobiológicos, o hospital dia, o curso de pós-graduação em medicina e a reforma da enfermaria 2A.
Recursos conseguidos no MS, SESAB e agências de fomento.
Em 2012, tirando proveito das minhas conexões com a França e do apoio do Professor Christian Trépo, cheguei até a Fundação Mérieux. Pude conversar diretamente com o Monsieur Alain Mérieux, Presidente do Conglomerado Mérieux, que tem uma Fundação Filantrópica para investimento em Ensino, Pesquisa e Formação de Recursos Humanos em países em desenvolvimento. Os investimentos da Fundação Mérieux estavam mais voltados à África, Vietnã, Camboja e Mongólia, mas conseguimos mostrar que a Amazônia brasileira não deixava a dever a esses países no quesito acesso à saúde. Há necessidade de gerar e democratizar conhecimento acerca da Hepatite Delta, que é um verdadeiro flagelo na região.
A Fundação Mérieux construiu no Acre um Laboratório de Biologia Molecular, investindo E 6 000. 000. 000,00.Recentemente, na semana passada, assinamos um Convênio com a Fiocruz, que deverá desenvolver sólidas pesquisas em Hepatites Virais na Amazônia.
Paralelamente, no HUPES, conseguimos recursos para formar profissionais em Biologia Molecular no nosso Laboratório Charles Mérieux, totalmente financiado pela Fundação Mérieux e que hoje tem a sua operação no escopo do projeto de cooperação FME/FM, assinado pela Thereza Tourinho após visita a Lyon.
Na Universidade, verticalizei a minha formação com Mestrado, Doutorado, Livre Docência em Hepatologia (o primeiro Livre Docente em Hepatologia Clínica do país) e, finalmente, Professor Titular. Cheguei ao topo da carreira, mas ainda não me sinto pronto para me aposentar, apesar de tantas adversidades que enfrentamos.
Minha História na Medicina Privada
No setor privado, ao chegar da França no final de 1989, início dos anos 1990, o meu primeiro consultório me foi oferecido pelo saudoso Professor Fernando Visco Didier. Iniciei as atividades na Clínica São Lucas, até que fui convidado pelos Professores Rebouças, Helito e Oddone Braghiroli para desenvolver minhas atividades no Instituto de Gastroenterologia e Hepatologia no Canela. Em 1990, soube pela Secretária do Serviço de Gastro-hepatologia, Letícia Pinchemel, que havia um processo seletivo para o Hospital Aliança sob o comando do Professor Gilson Feitosa. O Hospital Aliança estava próximo à sua inauguração. Uma obra do bem-sucedido empresário Baiano Paulo Sergio Tourinho chegava para revolucionar a medicina da Bahia.
O Professor Gilson Feitosa nunca tinha sido meu professor. De qualquer maneira, não hesitei em preparar meu currículo e levá-lo até ele. Entreguei à sua Secretária. Não tardou para que eu fosse chamado para uma entrevista e, no final, ouvi que eu era o tipo de profissional que o Aliança buscava. Adentrei no Aliança como Plantonista da Emergência, e lá estou há 33 anos, não mais como plantonista, pois agora estou diretor e sou médico atuante na instituição. Com muito orgulho, fiz parte da primeira turma de médicos contratados e, desde então, não atuei em nenhum outro hospital.
Lá, aprendi a admirar “tanta diferente gente”, mas foi na figura de Paulo Sérgio Tourinho, com a sua obstinação pela qualidade, pelo humanismo e pela prestação de bons serviços que tive uma grande experiencia de vida. Paulo Sérgio
Tourinho me ensinou a consolidar fortes valores. Foi lá, ainda, como plantonista, que tive a oportunidade de transportar, por duas vezes, Santa Dulce dos Pobres, a pedido do Paulo Sérgio Tourinho, seu amigo e um dos maiores beneméritos, SILENTE, do Hospital Santo Antônio. Paulo Sérgio era generoso, mas tudo fazia em silêncio. Semelhante ao que diz meu pai, “o que a mão esquerda faz, a direita não precisa saber”.
Foi no Hospital Aliança que eu fiz a minha clínica privada com muita paciência e intuição. Sr. Paulo Sérgio Tourinho, de quando em vez, me chamava para conversar, mas foi em 2012 que ele me convidou para ajudá-lo num outro Projeto fantástico, que se chama Fundação Maria Emília, hoje sob a Presidência de Tereza Tourinho, sua filha, e gestão de Thamile Accioly. Pude dar minha contribuição para essa Fundação e ajudar nos primeiros passos da sua estruturação, através de um Convênio firmado com a UFBA e a FAPEX, com o repasse de R$ 6.000.000,00 para pesquisa nas áreas de Hepatite, Leishmaniose e Asma.
Em seguida, veio também o convite para ser Vice-Presidente do Hospital, o qual inicialmente relutei, mas acabei aceitando, por ser uma solicitação deste grande amigo que sabia que eu não abandonaria a medicina assistencial e que seria um escudeiro fiel do humanismo e qualidade praticados no Aliança.
Mais adiante, veio a doença do Paulo Sérgio Tourinho e a sua escolha para que eu o acompanhasse durante toda a doença, apesar de não ser da minha área específica.
Com a passagem do Sr. Paulo Sérgio Tourinho, fui convidado pela família, nas pessoas de José Renato Tourinho e Thereza Tourinho, seus filhos, para continuar à frente do Hospital, mas sempre deixei claro que não abandonaria a Medicina pela Gestão. Entendi do José Renato que a minha função seria de Liderança e Coordenação, assim como a garantia para que mantivéssemos o compromisso do seu pai. Atravessamos uma fase de transição, muito bem conduzida pelo José Renato Tourinho, com a inestimável ajuda do meu amigo Albérico Mascarenhas (aqui representa os meus novos amigos), que foi o Diretor Operacional. Uma simbiose perfeita, que transformou uma gestão que tinha tudo para ser tensa em algo repleto de complementaridade e sucesso. O hospital foi bem, e atravessou os primeiros meses da Covid firme e forte. O Hospital, posteriormente, foi negociado ao Grupo D’Or. Já conhecia o Dr. Jorge Moll desde o período das negociações, mas foi após a venda que eu solicitei a José Renato uma conversa pessoal com ele. Vejo o Dr. Jorge Moll como um visionário. O projeto dos Hospitais Star e o seu interesse em fomentar o transplante no Brasil me encantam. O Instituto de Ensino e Pesquisa da Rede D’Or, IDOR é um Oasis no setor de ensino e pesquisa em instituições privadas no Brasil. Sob a gestão da excelente pesquisadora Fernanda Moll, tem robusta produção cientifica e investimento em formação de Recursos Humanos.
Na Bahia, sob a liderança regional do Rafael Vita, estamos no desafio de integrar os melhores hospitais da cidade no motivante trabalho em Rede. Mais uma vez, a paixão pela hepatologia me permite liderar um time de Hepatologia em seis estados do NE e no DF.
E, assim, estou no Hospital Aliança até hoje e permaneço na Universidade Federal da Bahia, nas minhas atividades de Ensino e Pesquisa. Associativismo
Fui presidente da sociedade Brasileira de hepatologia, o 1º eleito democraticamente, de 2009-2011. Minha Bandeira foi aumentar o acesso ao hepatologista no SUS e capilarização da Hepatologia no Brasil. A hepatologia expandiu. Criamos a Residência médica especifica em Hepatologia em 2010 em 8 unidades da Federação.
Fui presidente da Associação latino-americana de fígado (2018-2020) com o objetivo de conectar a hepatologia às associações para estudo do fígado da Europa e estados unidos.
Avançamos na difícil integração regional também. Sou membro titular da Academia de Medicina da Bahia, junto com vários colegas e ex-professores. Uma honra imensa pertencer a este seleto grupo de médicos da AMBA.
Final
Acredito que esta Comenda sugerida pelo Deputado Jean Fabrício seja pautada na minha defesa intransigente do SUS, do acesso à saúde e do combate às desigualdades sociais deste país. Agradeço mais uma vez ao Deputado Jean Fabrício e a todos os outros que aprovaram o meu nome para esta Comenda, incluindo o meu querido Deputado Adolfo Menezes.
Como disse no convite, uma pessoa” é a marca da lição diária de outras tantas pessoas”. Fiz o máximo esforço para citar todas as “tantas pessoas “que me ajudaram neste trajeto e que certamente continuarão a me ajudar diante de tantas outras realizações que ambiciono fazer.
Em tempos de grandes embates ideológicos, não me coloco bipolar entre a esquerda e a direita. Coloco-me entre os que têm juízo crítico. São os que recusam rótulos, mas jamais abandonam princípios.
Ando preocupado com a Medicina Brasileira. Acho que tomamos o caminho errado na proliferação de Escolas Médicas sem mínimas condições de funcionamento. Paralelamente, não estruturamos um setor regulatório, tampouco temos a capacidade de avaliação dessas Escolas para garantir a qualidade dos seus Egressos.
Onde está o exame do médico no debate?
É preciso garantir a qualidade do Médico que vai atender no Sistema Público de Saúde. Saúde não é caridade. Não se dá qualquer coisa a quem nada tem. Esse é um pensamento da elite atrasada e que afronta a cidadania. Todos os usuários do SUS merecem médicos bem formados, que tenham avaliações consequentes da sua qualidade técnica e moral.
Não posso concordar que o Brasil tenha mais Escolas Médicas do que a China e os Estados Unidos, com uma população bem menor e PIB muito inferior. Não tenho como aceitar que Escolas Médicas funcionem de maneira precária e que o Médico saia sem conhecimentos básicos sobre Verminose, como, infelizmente, eu já testemunhei. Eles vão cuidar de um ser humano.
Por outro lado, não posso aceitar que, covardemente, criem-se moratórias de Escolas Médicas, esquecendo a correção do erro.
Um habilidoso exercício de hipocrisia. Moratórias abrem a nefasta janela da Judicialização e não resolvem o problema.
Nenhuma sociedade moderna tem moratória para grandes ideias e projetos. Assim sendo, é absolutamente incoerente e muito pouco inteligente negar a aceitação de novas propostas de Escolas Médicas consequentes porque existem um punhado de Escolas Médicas de má qualidade. Esta é a nossa questão principal. Equilibrar mérito, necessidades sociais e racionalidade para fazer o que o país precisa na sua saúde.
Um Médico malformado é um Médico caro para o Sistema. Ou é um voraz solicitador de exames descontextualizados para compensar a sua insuficiência técnica, ou é um grande triador das Unidades Básicas de Saúde, deixando de resolver 70% dos problemas mais simples e causando pletora nos serviços mais verticalizados. Um Médico malformado encarece e reduz a resolutividade do Sistema, portanto, não é isso que desejamos no país. Isso inviabilizará o SUS.
Onde está a carreira do médico do SUS, concursado, no debate?
Um Médico malformado, se tiver fragilidade moral, rapidamente enveredará nas falsas especialidades médicas que permeiam as redes sociais, pródigas em fake news em saúde, com seus falsos conceitos, interesses comerciais gritantes e que não hesitam em expor seres humanos a riscos em nome da estética ou dos seus vis afrontamentos da fisiologia humana.
Da maneira que está, se não tivermos um posicionamento claro do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, chego a esta fase da minha vida, aos 64 anos, como Professor Titular, defensor do SUS e um Médico ativo na defesa das causas, muito preocupado com o futuro da Medicina no Brasil.
Por fim, quero agradecer a todos vocês pela presença, pela paciência em ouvir esse discurso/desabafo e pela generosidade daqueles que indicaram meu nome para esta Comenda. Mas eu quero dizer que esta Comenda é compartilhada com todas aquelas “tantas pessoas”, “tanta diferente gente”, que me ensinaram as lições diárias.
Estamos na casa do Povo. Numa casa sentinela da democracia.
Quem aqui praticar “o ser humano acima de tudo e a ética acima de todos” terá meu modesto apoio e agradecimento.
Muito obrigado!